quarta-feira, 21 de dezembro de 2016

O PENSAMENTO OBSESSIVO 思 SI




O PENSAMENTO,
FUNCIONAMENTO NORMAL DO ESPÍRITO HUMANO*
Elisabeth Rochat de la Vallée

O caracter que se traduz de bom grado por “obsessão” quando se está na patologia das emoções é também aquele que pode designar o pensamento em suas atividades mais nobres.
O pensamento e a reflexão são bons, quando eles estão no estreito fio do savoir-faire; nada escapa então à grandeza do espírito do homem:

“Quando o pensamento e a reflexão (si lü 思慮) do homem santo estão em função do savoir-faire (sagesse, zhi ), não há nada que não esteja ao alcance de seu conhecimento.” (Guanzi, cap. 64 Xingshijie )

O Coração sob a caixa craniana abrigando o cérebro, juntos, forma o caracter si : Pensamento – concepção – refletir – considerar – lembrar – obsessão – preocupação – suspirar por. A boa relação do Coração – e dos espíritos que nele residem – com o cérebro permite o desenvolvimento do pensamento. Uma relação ruim, uma perturbação do Coração proveniente dele próprio ou não, alteram o desenrolar normal do pensamento e o perverte em preocupação e obsessão.
O Lingshu, cap. 10 ressalta nitidamente a ligação direta entre o Coração e o cérebro; esta conexão pode passar pela língua e olho. O meridiano do Coração, Shaoyin da mão,

“a partir do sistema do Coração (xin xi 心系), enquadra a faringe e vai se conectar (xi ) ao sistema que liga o olho ao cérebro (mu xi 目系).

E o trajeto de ligação (o luo ),“segue o meridiano, penetra no centro do Coração e se conecta (xi ) à raiz da língua; ele faz obediência (se coloca sob a dependência de, shu ) ao sistema que liga o olho (ao cérebro, mu xi 目系).”

O Coração permite a fidelidade interior e, o cérebro, o bom funcionamento dos orifícios de comunicação com o exterior. A medula do cérebro é constituída por essências refinadas e sutis que manifestam a potência original e oculta dos Rins nas alturas irradiantes do corpo, onde elas têm a capacidade de acolher os influxos espirituais.
A boa relação do Coração, e dos Espíritos que nele residem, com o cérebro permite o desenvolvimento do pensamento. São necessárias a presença dos espíritos e a potência das essências mais sutis e puras na extremidade mais alta do indivíduo, em contato com os influxos que descem do Céu, para assegurar a mais nobre função do ser humano: o pensamento que caracteriza a espécie.
O pensamento permite apreender os elementos do raciocínio ou da consideração ao encadeá-los numa linha definida. Atinge o âmago das realidades apresentadas com acuidade e penetração, de modo a possibilitar a compreensão dos fatos a qual, por sua vez, leva à conjectura e à planificação.
O pensamento desconhece a hesitação, mas permanece na consideração. O tema é examinado e reexaminado; percebem-se melhor as questões colocadas; mas não se questiona o princípio, pois sabemos o que queremos e para onde tendemos, antes de reconhecer todos os pormoneres.
O início do Livro da História (Shujing) atribui ao imperador mítico Yao quatro grandes virtudes; saber pensar é uma delas:
“Yao revela uma vigilância assídua, uma inteligência penetrante, uma exímia distinção, um pensamento prudente; naturalmente e sem esforço.”
Mas se o indivíduo não sabe parar seu pensamento quando ele atinge seu objetivo, se ocupa o seu espírito com um esforço incessante de pensamento, se chega a considerar que não se preocupar é ser muito despreocupado, então o pensamento obscurece e desvia a razão; seu uso desregrado desgasta a vitalidade.
O Suwen repete o que dizem todos os livros de sabedoria:
“Ao exterior, eles (os Sábios) não sobrecarregavam seus corpos de afazeres. Ao interior, eles não se atormentavam com preocupações (si xiang 思想). A alegre serenidade era o que eles buscavam. Eles se ocupavam da plena possessão deles próprios.” (Suwen, ch. 1)
Nos textos médicos, o pensamento, antes de se pervetir, é igualmente apresentado como uma das grandes funções do espírito humano:

“Quando a vontade que se mantém se modifica, falamos em pensamento.” (Lingshu 8)

Longe de ser um paradoxo, descreve-se o processo que forma o pensamento:
“O conjunto formado pelo propósito e a vontade (a disposição interior, yi zhi 意志), estando-se fixado, vira e revira os dados, calculando, supondo, medindo; é então o pensamento.”(Zhang Jiebin)

Buscam-se todas as possibilidades de mutações e de alterações, porém sem vacilar, sem que a ancoragem, a orientação, a direção e o propósito, uma vez escolhidos, sejam questionados. Avalia-se e calcula-se sobre bases seguras e estáveis, à procura da eficácia. As facetas de um projeto inicial, de uma inspiração ou de uma idéia, são inspecionadas, mas não se deve brincar com um projeto, com um pensamento. Não conseguir deter-se numa idéia é patológico, na mesma medida em que é patológico não conseguir jamais mudar nada, quando uma nova era se anuncia ou quando as circunstâncias mudaram.

O PENSAMENTO, MOVIMENTO DO BAÇO-TERRA

Movimento Normal

O pensamento é apresentado aqui como a faculdade de conceber e combinar os planos com sabedoria e analisar as circunstâncias com profundidade. Ele é fundamentado sobre a memória das percepções e dos conhecimentos, das experiências e das cogitações. Ele é o processo pelo qual todos estes elementos se ligam e se combinam.
Estas atividades sobressaem do elemento Terra: a Terra recebe as sementes, amadurece-as e dá a cada uma o que lhe é apropriado. A Terra permite a mistura e a comunicação do que vem para seu seio; assim a água pode nutrir a vegetação e se transformar em seiva... O pensamento, baseando-se em toda a memória, permite as permutações, as compenetrações e colocar em relação, o que conduz à tomada de forma.
O pensamento é então associado ao Baço, que encarna a Terra no ser humano:

“A Terra [....]  Nos zang, é o Baço [....]  Nas vontades, é o pensamento   (si ).” (Suwen  5)

Des regramento

“O pensamento obsessivo (si ) prejudica o Baço, a cólera o arrebata no pensamento obsessivo.” (Suwen 5)

Quando os movimentos de sopros – análogos aos do Baço-terra – que elaboram o pensamento não são corretamente regulados, então o pensamento se transforma em preocupação, inquietação, tormento, obsessão. Este pensamento obsessivo poderá tomar diversas cores e ser inquieto ou ansiosamente agitado, desanimado ou alarmado; poderá gerar obstáculos e paralisar o pensamento ou o transformar em máquina louca e repetitiva.
A repetição que pode ir até a compulsão, marca bem a deterioração do Baço. No lugar de circular e de evoluir, de ser transportado e transformado, o pensamento estagna no lugar, atola na umidade, como viajantes mal equipados na floresta. No lugar de avançar, anda-se em círculos. Os sopros que já não conseguem circular, se bloqueiam e fazem nós:

“Quando há pensamento obsessivo, o Coração tem onde morar (constantemente e obsessivamente), os espíritos têm onde se referir (sem parar e sem evolução); os sopros corretos (zheng qi 正氣 ) permanecem no lugar e não circulam. É assim que os sopros são amarrados (jie ).” (Suwen  39)

Fica-se preso na mesma imagem, na mesma idéia; fica-se preso na mesma coisa, incapaz de se liberar de um pensamento que ocupa todo o mental e mobiliza todas as forças.
O Coração está implicado, pois ele é a sede de todas as emoções e o lugar do pensamento.
Como o pensamento é uma “emoção”,é pouco habitual no Ocidente, tratar o pensamento como uma emoção. Sem querer retomar aqui a definição das emoções ou a análise da noção em Chinês, dirá-se simplesmente que o pensamento é um movimento específico de sopros no interior do mental, naquilo que constitui a trama e a substância da vida interior, naquilo que marca as tendências que vão determinar as reações e as ações da vida. Neste sentido, é uma emoção. Sua normalidade é o equilíbrio com os outros movimentos de sopros. Sua patologia desequilibra o todo por excesso.
Quando as atividades do pensamento, visto como as atividades dos sopros do Baço-Terra ao interior do metal, do Coração, são excessivas, elas levam ao bloqueio.
Um exemplo de desequilíbrio pode ser a má relação entre a Terra e a Madeira, o Baço e o Fígado, o pensamento que cria ligações e a potência da imaginação e da cognição.

A REFLEXÃO OU PROJETO, MOVIMENTO DO FÍGADO-MADEIRA
Uma noção se encontra muito regularmente associada àquela do pensamento que pode voltar à obsessão. No Lingshu cap. 8, é a etapa que segue o pensamento (si ) na elaboração do mental e da consciência:

“Que o pensamento se desdobre ao longe e com força falar-se-á de reflexão ( ).”
O pensamento (si ) é então concebido mais como voltado para o que já foi adquirido, conhecido, como um aspecto yin de ligação e consolidação. É necessário então adicionar-lhe seu aspecto yang complementar que trabalha mais sobre o imaginário, a invenção, a projeção no futuro, para que o pensamento seja completo e sirva para guiar a vida através das circunstâncias sempre mutáveis.
“Quando o pensamento, que se modificava e buscava, se inverte e se dirige para longe em direção ao futuro, temos a reflexão.” (Taisu)

A expressão si lü 思慮 significa: refletir intensamente (uma reflexão que normalmente chega a uma decisão); solicitude, estar preocupado; pensamentos obsessivos e preocupações. São os mesmos caracteres que, considerados positivamente, correspondem ao que entendemos por "pensamento e reflexão", e que, considerados negativamente, são a inquietação pungente, as preocupações, os aborrecimentos, a preocupação obsessiva.
Para transformar-se em projeto, o pensamento precisa, além de uma consideração ampla e profunda e de uma grande envergadura, do enraizamento ter permanecido sólido e o vínculo, firme no Coração.
Esta projeção reflete os sopros da Madeira, que dão o impulso necessário para ir adiante, até o fim. A reflexão reflete a capacidade do Fígado de gerir o mental, a inteligência, capacidade que faz dele a morada das almas Hun.
A reflexão pertence ao Fígado, como o pensamento pertence ao Baço. O simples pensamento reflete sobre elementos já vivenciados; aprendem-se as lições da experiência, medita-se, e, precisamente falando, cogita-se. Tira-se do húmus do já visto, já vivido, o fruto de experiências aprendidas e assimiladas. É o papel do Baço, que digere, assimila e transporta até as extremidades para nutrir.
A reflexão projeta em direção ao futuro, a fim de realizar o que ainda não ocorreu. Ela imagina, a partir do real. Ela é capaz de analisar os elementos do pensamento para ver o que pode ser concebido e realizado, permanecendo na realidade dos fatos e fiel à sua natureza própria.

“O Fígado tem o cargo de comandante dos exércitos (jiang jun 將軍), análise de conjuntura e concepção de planos (mou lü 謀慮) procedem.” (Suwen  8)

Como um general, o Fígado deve meditar e refletir longamente, para estabelecer um plano de batalha inteligente e sensato, livre das paixões, no qual a imaginação e a cogitação próprias aos Hun seguem fielmente a inspiração dos espíritos, a fim de garantir uma eficácia máxima.
O caracter da reflexão, , ilustra bem o que ela é. Ele é formado das listras do tigre envolvendo o pensamento  . significa: Projeto - concepção de planos - meditação - refletir - considerar atentamente - conjecturar - avaliar - premeditar - zelar - ter cautela - solicitude - preocupação - dúvida - incerteza.
O tigre salta poderosamente e longe, cai no lugar exato e detém sua presa no solo, imobilizando-a. O mesmo tigre permanence imóvel, até no olhar que vigia sem piscar, horas a fio. Ele espera. As listras revelam sua natureza. O repouso concentrado e o desencadeamento de um movimento calculado são os dois aspectos da mesma virtude; dois aspectos que se destacam no desenho regular de alternância da cor sobre uma pelagem fina e abundante.
As listras do tigre acrescentam ao pensamento uma consideração atenta, por vezes mesmo uma preocupação, mas que permite ao espírito arriscar-se, avaliar suas estimativas e planejar com conhecimento de causa.
Não há diferença entre a reflexão e o projeto, a concepção dos planos. O Fígado impulsiona longe e com impetuosidade, vai em frente, dá o impulso e o ímpeto: nada vai mais longe e em menos tempo do que o olhar. E nós sabemos que o olhar é o irromper do Fígado, através do orifício ocular.
Da mesma maneira que o Fígado-Madeira ajuda à expansão do Baço-Terra para que as circulações se realizem bem e que tudo seja distribuído sem obstrução, eis aqui o pensamento que se realiza através da reflexão, que o leva para longe ao mesmo tempo em que lhe aumenta a potência.
Deve-se em seguida tomar uma decisão e manter-se a ela firmemente, sem mais se preocupar em reconsiderar os incovenientes e as vantagens de cada plano possível. Isto seria análogo a uma obstrução do Fígado-Madeira pelo Baço-Terra, o que é também o ciclo de contra-dominação dos Cinco elementos.

“O Fígado é o general do Centro; sua decisão (jue ) vem da Vesícula Biliar; e a faringe é seu menssageiro. Um homem pode ter múltiplas análises de conjuntura e númerosas concepções de planos (mou lü 謀慮), mas, se há um vazio na Vesícula Biliar, ele não toma decisão (bu jue 不決 ).” (Suwen  47)
O vazio da Vesícula Biliar, dinamismo yang da Madeira, enfraquece a determinação e impede a passagem à ação. Não mais é a obsessão fixa sobre um único pensamento; é a multiplicação desordenada dos pensamentos. Não mais se teme morrer afogado; imaginam-se mil mortes; não mais se considera uma dificuldade, inventam-se dez mil. Mas sem concluir em nada. O delírio da perseguição e a paranóia não estão longe.

A OBSESSÃO DO DESEJO

Ter uma idéia fixa não é necessariamente um pensamento obsessivo, isto pode ser um desejo. O melhor exemplo ainda é a obsessão sexual:
“O pensamento carregado de preocupação (si xiang 思想) pratica indefinidamente, sem que se chegue a obter o que se aspira; o propósito (yi ) se distribui sem controle ao exterior; pratica-se intensamente o quarto de deitar (atividades sexuais); então o músculo ancestral (zong jin 宗筋 ) se afrouxa até o completo relaxamento.E se produz impotências no muscular (jin wei 筋痿), até causar escoamentos incontrolados da substância branca.” (Suwen  44)
O desejo não logra ser satisfeito, seja por não ser realizado, seja por que se quer sempre mais. A pessoa perde o controle de seus pensamentos e desejos, que são imantados para o exterior; o que impede de voltar a si. O desregramento da conduta se traduz por uma sexualidade desenfreada que desgasta as essências e os sopros e prejudica os Rins.
Entretanto o bloqueio resultante da obsessão agitada gera um calor reativo: o fogo do desejo. Este fogo contribui para a deterioração das essências e dos sopros. O sangue enfraquecido já não dá força e vigor aos movimentos musculares, o que se traduz em particular por uma falha de ereção (relaxamento do músculo ancestral) e em geral por paralisias flácidas devido à falta de irrigação e de força nos músculos (impotência do muscular). Empurradas para fora do corpo pelo fogo interno, ou se escoando devido à falta de sopros para as reterem, as essências se perdem, por exemplo, em espermatorréia (escoamentos incontrolados da substância branca).

PENSAMENTOS OBSESSIVOS E PREOCUPAÇÃO ESVAZIAM O CORAÇÃO

O Coração já não consegue manter as circulações vitais
O Coração pulsa o sangue no corpo. Tudo o que bloqueia ou enfraquece os sopros capazes de dar este impulso esgota o Coração e atrapalha suas comunicações.

“Sob o efeito da opressão e do pesar, dos pensamentos obsessivos e preocupações (you chou si lü 憂愁思慮 ), o Coração é prejudicado.” (Suwen 73)

“Em caso de preocupação e de opressão (si you 思憂), o conjunto das conexões do Coração (xin xi 心系 ) aperta-se (ji ); estando assim apertado, o caminho dos sopros ficam estreitados (yue ); estando estreitados, já não há fluidez.” (Lingshu 28)

Os pensamentos (si ) obsessivos e o pesar (you ) se aliam para impedir as ciruculações do sangue e as comunicações do Coração com todo o corpo, em particular os órgãos. Ver adiante o estudo do pesar opressivo (you ).

Entre Baço e Coração
“ [...] diagnostica-se um acúmulo de sopros no centro. Tem-se frequentemente danos ligados à alimentação. O nome é Bloqueio do Coração (xin bi 心痹). Contrai-se este mal através de danos exteriores, pois os perversos exteriores beneficiam-se do vazio do Coração causado por pensamentos obsessivos e preocupações (si lü 思慮).” (Suwen 10)

Os recursos do Coração são mobilizados pelos pensamentos obsessivos, e a capacidade dos seus sopros enfraquece. Os sopros do Coração e do peito são solidários dos sopros yang que asseguram a defesa do organismo; quando estes últimos estão diminuídos, as agressões dos perversos externos são mais fáceis e mais virulentas, o que agrava a situação e enfraquece ainda mais os sopros que já não são capazes de assegurar as boas circulações. Estes se acumulam no peito e bloqueiam o Aquecedor Médio; são os bloqueios (bi ) do Coração. O Coração gasta seus recursos e suas forças re-considerando pensamentos obsessivos e pesarosos.
Em termos de ciclo de geração, dirá-se que o fogo do Coração, tornado impotente, não mais consegue vivificar o Baço, do qual o yang se encontra muito fraco para assegurar distribuições e transmissões. De onde vem o bloqueio sobre a alimentação, um freio particularmente aos movimentos de descida assegurados pelo Estômago. Come-se menos, digere-se mal... O enfraquecimento do Baço agrava a obstrução causada por pensamentos parasitas e repetitivos.

“Quando o Coração é acometido pela apreensão e pela ansiedade (chu ti 怵惕), pelos pensamentos obsessivos e pelas preocupações (si lü 思慮), os espíritos (shen ) ficam prejudicados. Prejudicados os espíritos, sob o efeito do medo e do temor (kong ju 恐懼), o indivíduo perde a posse de si mesmo; as formas arredondadas se descarnam e a massa da carne fica devastada.” (Lingshu  8)

Aqui já não se trata de um pensamento justo, que se desdobra com força ao longe em uma reflexão apropriada, capaz de organizar todos os elementos de uma situação ou de um ser, do meu ser. A apreensão e a ansiedade, instaladas nas profundezas do Coração, o tornam incapaz. Neste estado, os pensamentos e reflexões, que deveriam nos aclarar, estão desequilibrados, agravando a situação. Espada de dois gumes, pensamento e reflexão, mal conduzidos, se voltam contra aquele que os abriga, prejudicando os espíritos do Coração. O indivíduo se faz mal por seus próprios pensamentos, se tormenta por uma caricatura de sua reflexão. Ele aumenta a falta de posse de si mesmo, através do mau uso.
O Baço está enfraquecido, vazio daquilo que deveria vivificá-lo: o Coração que é o Fogo. É a força de expansão do Fogo que sustenta o movimento de distribuição dos nutrientes nas espessuras da carne, movimento da Terra, próprio ao Baço. Em caso de fraqueza deste Fogo, o Baço já não tem força nem para distribuir, nem mesmo para transformar, isto é, assimilar as essências nutritivas liberadas pela digestão.
O Baço é atacado pelo que ele deveria dominar: os Rins que são a Água. O Baço, pela sua capacidade de transformar e integrar a umidade do corpo tempera e equilibra os líquidos, a água do corpo, sob obediência dos Rins. Se o Baço, mal vivificado, perde sua aptidão de transformar, metabolizar, assimilar e transportar, distribuir; então os líquidos, a Água, se voltam contra ele, o inundam, o perturbam, o enfraquecem ainda mais o obstruindo com umidade. Em conseqüência, a força yang dos Rins, os sopros, que são encarregados de reter e transformar os líquidos no nível dos Rins, também diminuem.
A destruição da forma corporal, visível no emagrecimento, é consequente ao desperdício da vitalidade e à perda, pelo escoamento, das essências (do Baço e dos Rins) incapazes de regenerar e nutrir as carnes.

Um Coração livre para pensar
Ter no Coração, uma idéia, um pensamento, um objeto de solicitude é próprio ao homem. Mas fazer do pensamento uma preocupação e um pensamento obsessivo, uma obsessão que corrói e consome, é uma perversão; seria melhor um Coração vazio. O Santo não tem preocupação nem obsessão, ele se mantém na vacuidade e na pura serenidade; ele não deixa murmurar nem proliferar idéias e reflexões.
Não se é nunca mais profundamente pervertido que pelo que tem uma ligação natural consigo. O Coração, lugar do pensamento, será danificado e perturbado pelos pensamentos. Perturba-se e usa-se o Coração através de pensamentos obsessivos e preocupações, por um mau uso das suas capacidades de pensar e sentir; o que o entrega, chegado o momento, à agressão dos perversos exteriores.
Um Coração invulnerável é um Coração vazio. Pois o Coração não está aí simplesmente para permitir a germinação dos pensamentos, ele é o que permite ao homem se dilatar nas dimensões Céu/Terra; nenhum pensamento obsessivo deve retê-lo nem diminui-lo; nenhum pensamento deve ocupá-lo em detrimento de sua visão e de sua Inteligência espiritual.

PENSAMENTO E SANGUE
O Baço nutre o Coração e lhe permite assim elaborar tanto o sangue quanto o pensamento. Diz–se às vezes que o pensamento vem do Baço, mas se forma no Coração. É o mesmo para o sangue.
Pensamentos obsessivos, inquietações e preocupações trazem ou denotam um mau funcionamento dos sopros do Baço. O Baço se torna incapaz de nutrir corretamente o Coração.
Os sopros do Baço já não conseguem estabelecer as ligações, manter a memória, receber as informações e tratá-las. As idéias e imagens não se apresentam mais ao Coração em uma forma justa e frutífera.
Se o Baço não consegue fornecer líquidos suficientemente ricos, o sangue será muito pobre para permitir a presença dos espíritos, da consciência. As essências serão insuficientes para formar espíritos vitais (jing shen 精神) fortes. Ao lado dos sintomas consequentes ao empobrecimento do sangue, tem-se problemas mentais.
O vazio de sangue do Coração pode dar atordoamento, vertigens e problemas da visão, palpitações com uma sensação de mal estar e de calor. A falta de expressão dos espíritos se traduz então em afobamento, confusão, aturdimento.
A insuficiência dos espíritos do Coração traz agitação, apreensão, ansiedade, falta de discernimento; mas também problemas do sono, insônia, pesadelos.
O duplo dano de Coração e Baço se manifesta por esquecimentos, perdas de memória; perdem-se as coisas; falando, trocamos uma palavra por outra, torna-se incoerente... Fleuma pode se formar no peito, nas proteções do Coração, e obstruir os orifícios do Coração, levando assim à loucura.





Tradução :Andrea Jacusiel

* Extraído da apostila 'As Emoções', editada pela E.E.A.
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ZHUANGZI ch. 5 - Trad. Jean Lévi

  O Tao deu-lhe a sua aparência e o céu a sua forma, porque deixaria que as paixões prejudiquem o seu corpo? Você se deixa distrair pelo mu...